Sistematização das grandes novidades no ICMS-Social do meio do ano de 2024

As mudanças reforçam a importância do Programa ICMS-Social enquanto política de Estado em Sergipe.

Entre os meses de julho e agosto de 2024, 04 grandes novidades despontaram no âmbito do Programa ICMS-Social. Este artigo tem por objetivo sistematizá-las e contextualizar a importância de cada para a implementação efetiva do programa. O exercício é essencial para compreensão do quadro em que se insere a recente publicação dos resultados preliminares do ICMS-Social.

As 04 grandes novidades foram: (i) maior importância do Índice Municipal de Qualidade da Educação (IQE) na repartição do ICMS, (ii) incorporação da dimensão da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos, no IQE, (iii) nova composição da equipe que gere o programa e (iv) publicação de edital que visa à formação de grupo de especialistas externos para análise do impacto do ICMS-Social nos municípios.

Primeiramente, trataremos do aumento do percentual do IQE na repartição do ICMS-Social, institucionalizado por meio da promulgação da Lei nº 9.509/2024, que alterou a Lei nº 8.628/2019. Com a nova legislação, amplia-se a distribuição de recursos financeiros do Governo do Estado aos municípios, por meio da quota social do ICMS-Municípios, de acordo com o Índice Municipal de Qualidade da Educação (IQE). O percentual do IQE foi incrementado de 10% para 18%, observado regime de transição, conforme abaixo.

DISTRIBUIÇÃO DA QUOTA SOCIAL (ICMS-MUNICÍPIOS)
ANOIQE
(educação)
IQS
(saúde)
Parcela igualitáriaTOTAL
202325% 25%
202410%1%14% 25%
202514% 2%9%25%
a partir de 202618% 3% 4% 25%
Fonte: Adaptado da Lei nº 8.628/2019.

Destaca-se que os 8% a mais destinados ao IQE migraram da parcela igualitária (dividida igualmente entre todos os 75 municípios), o que reafirma a importância do Programa ICMS-Social enquanto indutor de boas práticas nas políticas sociais dos municípios, o que vem sendo referendado pelos Poderes Executivo e Legislativo estaduais.

Assim, com o maior percentual para o IQE no ICMS-Social, o Governo do Estado estimula os municípios a se engajarem no processo de melhoria da educação, à medida que serão premiadas com maiores recursos financeiros as municipalidades que demonstrarem evolução nos índices de seus educandos.

Em vista disso, cabe listarmos os principais indicadores que compõem o IQE, conforme quadro abaixo.

Indicadores considerados no IQE – ICMS-Social
1. Resultados no Saese (Sistema de Avaliação da Educação Básica de Sergipe):
a) 2º ano Ensino Fundamental (EF): Alfabetização.
b) 5º ano EF: Português e Matemática.
i. Indicador de contexto socioeconômico (Inse).
c) Proporção de alunos dos 2º e 5º anos EF avaliados.
2. Taxa de aprovação nos 5 primeiros anos do EF.
Fonte: Elaboração própria.

Destaca-se que o indicador que afere o nível de alfabetização atingido pelos educandos do 2º ano do Ensino Fundamental da rede pública apresenta o maior peso para cálculo do índice.

Nesse sentido, é importante esclarecer o contexto no qual a alteração legislativa se insere: após processo de retomada econômica e social pós pandemia da Covid-19, observou-se que, em 2024, os resultados da alfabetização das crianças sergipanas atingiram patamar similar ao período pré-pandêmico. Entretanto, constatou-se que há ainda grandes desafios a serem superados para atingir níveis ideais, como demonstrado pelos recentes indicadores nacionais.

Para superação de tais desafios, a continuidade e ampliação de programas como o ICMS-Social, que estimulam o alcance de bons resultados educacionais e promovem o acompanhamento das políticas públicas, mostram-se essenciais.

Tal constatação está dentro de um debate nacional, liderado por especialistas e pelo Ministério da Educação, acerca do ICMS-Educacional, que vem corroborando a importância do repasse de parcela do ICMS-Municípios com base em resultados de educação para incremento dos índices educacionais no país. 

Acompanhando tais evidências, o Governo de Sergipe desponta em âmbito nacional com a recente alteração legislativa, que incrementa o percentual destinado ao ICMS-Educacional acima do mínimo de 10% exigido constitucionalmente (conforme Emenda Constitucional Federal nº 108/2020).

A próxima novidade a ser abordada é a incorporação da dimensão da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos, no IQE, oficializada pelo Decreto nº 750/2024, que alterou o Decreto nº 40.540/2020

Essa alteração está ligada diretamente a preceito constitucional (Emenda Constitucional Federal nº 108/2020) e à Lei Federal nº 14.113/2020, que regulamentou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). 

O embasamento pormenorizado acerca da alteração na legislação sergipana pode ser conferido na Nota Técnica nº 02/2024, de elaboração da Comissão Especial do ICMS-Social. Neste artigo, realizaremos um breve resumo.

Primeiramente, cabe mencionar que resolução da Comissão Intergovernamental de Financiamento da Educação Básica de Qualidade (CIF/MEC) determinou que, a partir de 2025, os estados deverão distribuir a parcela do ICMS-Educacional com base em indicadores não só de melhoria nos resultados de aprendizagem, mas também de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos, sob pena de não receberem a parcela de complementação do Valor Aluno-Ano por Resultado do Fundeb (VAAR-Fundeb), destinada da União aos estados e municípios.

Tendo em vista tal exigência, a Comissão Especial do ICMS-Social – em parceria com representantes da Secretaria de Estado da Educação de Sergipe (Seduc/SE), da Associação Bem Comum (ABC), da Secretaria Municipal de Educação de Itabaianinha e da Universidade Federal de Sergipe (UFS) – tratou por analisar criticamente a legislação de outros estados que já atendiam à demanda e, em seguida, propor uma metodologia inovadora para o indicador sergipano, de modo a cumprir todos os requisitos exigidos na legislação federal, atender a boas práticas e assegurar um regime de transição gradual para todos os municípios, de forma transparente e juridicamente segura.

Os grandes balizadores que orientaram a construção do indicador podem ser resumidos da seguinte forma:

I. A incorporação da dimensão da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos, terá como base o Indicador de Nível Socioeconômico (Inse) dos estudantes de 5º ano do EF.

II. A composição do Inse será com base nos resultados do questionário de contexto socioeconômico, aplicados por ocasião das provas do Saese.

O Inse é calculado com base nas respostas dos educandos a 19 itens que se referem a dois elementos: a escolaridade dos pais e a posse de bens e serviços.

III. Na fórmula do IQE, não será adotado o “Inse puro” dos municípios. Essa premissa se desdobra em duas dimensões:

a) A mensuração da equidade atingida pelo município levará em conta resultados educacionais nos diferentes níveis socioeconômicos dos educandos de 5º ano do EF (dos quartis inferiores aos superiores), de modo que em cada quartil será avaliado o nível de igualdade na aprendizagem. A imagem a seguir ilustra os quartis e os 3 grupos sob análise do IQE.

BRASIL. INEP. SAEB 2021: Indicador de Nível Socioeconômico do SAEB 2021 - Nota Técnica. Brasília, DF, Inep/MEC, 2023. Disponível em: Acesso em 29 ago. 2024.
Fonte: BRASIL. INEP. SAEB 2021: Indicador de Nível Socioeconômico do SAEB 2021 – Nota Técnica. Brasília, DF, Inep/MEC, 2023.

Com essa metodologia, temos que, quanto maior o esforço do município em assegurar a aprendizagem adequada em cada grupo do Inse, maior será a redução da desigualdade educacional em cada quartil e, consequentemente, maior será o valor que receberá a título de ICMS-Social.

Na fórmula, os maiores pesos (40%) são conferidos à equidade de aprendizagem para o grupo de educandos situados no 1º quartil do Inse (grupo 1) e também para a totalidade dos educandos (grupo 3). O restante do peso (20%) é conferido à equidade na aprendizagem observada na metade inferior do Inse (grupo 2). Essa sistemática, inovadora em âmbito nacional, atenta à equidade no aprendizado que o município consegue promover à totalidade de seus educandos, mas ao mesmo tempo dá especial enfoque aos resultados atingidos por aqueles educandos de níveis socioeconômicos mais baixos.

b) Haverá uma contextualização dos Inses atingidos pelos municípios em comparação a seus pares. Ou seja, o resultado no Inse de um município será comparado com os dos demais municípios sergipanos, gerando uma escala que evidenciará a realidade do estado.

IV. Não adoção do instrumento de equidade como medida compensatória a municípios com menor Inse.

Diferentemente de alguns estados, a “dimensão da equidade no IQE, considerado o nível socioeconômico dos educandos” não funcionará como mera medida compensatória a municípios que apresentam menores Inses. O índice sergipano atentará à equidade na aprendizagem que o município promove, premiando avanços em termos de aprendizagem e equidade.

Apresentados os grandes balizadores do “novo IQE”, finalizamos essa seção esclarecendo que a fórmula do “antigo IQE”, que atentava somente à melhoria da aprendizagem, transformou-se no somatório do novo Índice Municipal de Melhoria da Aprendizagem (IMA) com o Índice Municipal de Aumento da Equidade (IAE). O peso destinado ao IMA é de 95%; já ao IAE, ainda em fase de experimentação, é 5%.

Assim, a fórmula do novo IQE ficou a seguinte: IQE = 0,95 IMA + 0,05 IAE, conforme pode ser visualizado nas imagens a seguir, que detalham, respectivamente, o IMA e o IAE:

Detalhamento do Índice Municipal de Melhoria da Aprendizagem (IMA):

IMA
Fonte: Elaboração própria.

Detalhamento do Índice Municipal de Aumento da Equidade (IAE):

IAE
Fonte: Elaboração própria.

Para maiores explicações acerca dos pormenores da nova fórmula, sugerimos consultar a apresentação realizada pela Comissão Especial do ICMS-Social ao Ministério da Educação (MEC).

Encerramos essa seção com o esclarecimento de que, nos resultados preliminares publicados em agosto de 2024, essa fórmula já foi adotada. Logo, a repartição do ICMS-Social em 2025 já levará em conta o indicador de equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos. 

O terceiro grande ponto deste artigo trata da nova composição da equipe que gere a implementação do ICMS-Social. O Decreto nº 750/2024, que atualizou o Decreto nº 40.540/2020, designa a Secretaria Especial de Planejamento, Orçamento e Inovação (Seplan) para que, junto à Secretaria Especial de Governo (Segov), efetue a governança pública do Programa ICMS-Social. Com isso, o ICMS-Social fica mais próximo à agenda estratégica do governo.

Além disso, o decreto incorpora a Secretaria Especial de Articulação com os Municípios (Seam) à Comissão Especial do Programa. Essa alteração atenta ao novo compromisso do Programa ICMS-Social, de atuar no monitoramento das ações municipais que tenham relação com os indicadores que compõem o IQE e o IQS. Para cumprimento desse compromisso, a Comissão Especial do ICMS-Social contará com apoio da academia, o que nos leva à última grande novidade do meses de julho e agosto.

O quarto grande ponto a ser destacado neste artigo é a publicação de edital, por meio da Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec/SE) e da Seplan, que objetiva a formação de grupo de especialistas externos para (i) análise do impacto do ICMS-Social e (ii) apoio à implementação de sistemática de monitoramento da gestão dos municípios

As propostas já foram recebidas pela Comissão Especial do ICMS-Social e o período de avaliação e julgamento vai até 30 de setembro, com divulgação de resultado preliminar a partir de 02 de outubro.

Com a implementação dos trabalhos, previsto para iniciar em novembro, espera-se o aperfeiçoamento da formulação de políticas públicas em âmbito estadual e municipal, naquilo que tenha relação com os indicadores previstos no ICMS-Social.

Chama-se atenção desde já ao primeiro grande desafio que a Comissão Especial do ICMS-Social e os grupos de pesquisa terão: subsidiar tecnicamente o debate que envolverá a reavaliação dos índices e impactos do ICMS-Social no início dos governos municipais em 2025 (Art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.628/2019).

Diante do exposto, após terem sido apresentadas as grandes novidades dos últimos meses no âmbito do ICMS-Social, esperamos ter esclarecido a importância que o tema tem recebido no governo e o contexto no qual se insere a recente divulgação dos resultados preliminares. 

Guilherme Bratz Uberti e Thiago Menezes Santana
Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental
Coordenação da Comissão Especial do ICMS-Social

Última atualização: 29 de agosto de 2024 12:39.